Monday, April 26, 2010

Eder Chiodetto - Colaboração para a Folha

Num tempo em que a palavra instantâneo significava “daqui a pouco” e não “imediatamente”, as câmeras Polaroid surgiram e se tornaram um fenômeno de mercado. Era o final da década de 1940 e o mundo se enebriava com a aceleração modernista.

A ideia de suprimir o tempo entre o click e a cópia fotográfica, aplacando a ansiedade por ver o resultado, foi o primeiro fator a fazer das câmeras instantâneas um sucesso. Mas não só. No mundo dominado por câmeras digitais a velocidade de tartaruga das Polaroids já não importam nada. Este bem vindo regresso dela ao mercado visa suprir outras questões.

A estética da Polaroid é fundada no erro. Contra a mega definição da imagem propiciada pela combinação de milhões de pixels, ela oferece uma imagem sem muita nitidez, com foco precário, cores distorcidas e esmaecidas que continuam se alterando no tempo quando expostas a luz. E, pior, essa geringonça que para as novas gerações é algo tão retrô como convidar alguém para jogar Genius ou tomar uma Crush, sequer gera uma matriz que possa gerar novas cópias. Uma Polaroid é única.

Tamanha imprecisão, no entanto, é o que de fato atrai fãs no mundo inteiro entre fotógrafos profissionais e amadores, da mesma forma que atraiu artistas como Andy Warhol, Robert Frank, David Hockney, Robert Mapplethorpe e Ansel Adams, por exemplo, que terão algumas de suas “polas” levadas a leilão pela Sotheby’s, em Nova York, em junho deste ano. Comenta-se que as cifras obtidas serão monumentais.

O fato é que a imagem errática propiciada pelas Polaroids atenta contra a ideia de um real absoluto na fotografia. Zomba com a crença que devotamos à faculdade do olhar. Nada é o que parece ser, nos diz a imagem que é cuspida pela câmera após um bizarro grunhido mecânico.

É isso! A imagem da Polaroid injeta lirismo, atmosfera de sonho e memória onde a fotografia tradicional geralmente prega a mimese e o apego à representação perfeita do referente. Suas imagens são menos a representação do “isto foi”, como escreveu Roland Barthes, e mais um “isto poderia ser”. Ela não denuncia uma presença, apenas tateia uma possibilidade. Não é uma certeza, mas um apontamento, como um desenho em rascunho. Uma forma de ver o mundo restaurando uma poética não mensurável a olho nu.

Nesses tempos de precisão tecnológica e velocidade de transmissão de dados, o retorno da Polaroid representa uma visita nostálgica e necessária a um tempo mais dilatado e menos assertivo de apreensão do visível. Fotografia bossa nova.

1 comment:

Maíra Gamarra said...

Ah delícia! Como sempre, belo texto de Eder. Viva à polaroid!
E parabéns ao Sx70, que nos brinda com esse trabalho encantador!